O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), através da Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), resgatou 563 trabalhadores em Porto Alegre do Norte, a cerca de mil quilômetros de Cuiabá (MT), nesta quarta-feira (6). Os auditores-fiscais encontraram esses profissionais, recrutados em regiões Norte e Nordeste do Brasil, em condições análogas à escravidão em um canteiro de obras de uma usina de etanol na zona rural.
A operação, que teve início em 28 de julho, contou com a colaboração do Ministério Público do Trabalho (MPT), apoio da Polícia Federal e do Projeto Ação Integrada (PAI). A ação foi motivada por um incêndio que destruiu o principal alojamento dos trabalhadores, provocado, segundo testemunhos, por operários que protestavam contra as frequentes falhas no fornecimento de energia elétrica e água potável, problemas estes que afetavam a saúde e o bem-estar dos empregados.
O incêndio revelou uma situação de extrema precariedade: os alojamentos eram pequenos e superlotados, com quartos de apenas 12 m² ocupados por até quatro pessoas, sem ventilação ou climatização. Após o sinistro, alguns trabalhadores foram transferidos para casas e hotéis nas proximidades, mas muitos permanecem em condições degradantes, dormindo em colchões no chão, sem camas adequadas ou espaço para guardar seus pertences. Muitos perderam tudo no incêndio, e alguns foram acomodados em um ginásio de esportes em um município vizinho.
Além das condições inadequadas de hospedagem, os auditores descobriram que não foram registradas Comunicações de Acidente de Trabalho (CATs) para todos os feridos no incêndio, o que comprometeu o acesso a benefícios previdenciários e acompanhamento médico, configurando a violação de direitos dos trabalhadores.
A fiscalização também identificou um esquema de aliciamento de trabalhadores, com indícios de servidão por dívida e tráfico de pessoas. A empresa utilizou métodos agressivos de recrutamento em estados como Maranhão, Pará e Piauí, por meio de carros de som e mensagens em grupos de WhatsApp, prometendo remunerações elevadas e horas extras.
Testemunhos revelaram que muitos trabalhadores pagaram intermediários para garantir suas vagas e arcaram com os custos de transporte e alimentação. Em alguns casos, mesmo com a viagem custeada pela empresa, os valores foram descontados dos salários, o que é considerado uma prática ilegal.
A empresa mantinha ainda um sistema paralelo de controle de jornada, informalmente chamado de “ponto 2”, para registrar horas extras que não apareciam nos controles oficiais. Esses pagamentos eram feitos em dinheiro ou por cheques, sem registro adequado e sem a devida contribuição ao FGTS.
Relatos indicam que muitos operários enfrentavam jornadas extenuantes, incluindo trabalho aos domingos, violando a legislação trabalhista. As promessas de horas extras elevadas, no momento da contratação, mostraram-se enganosas diante da realidade vivida.
Diante das irregularidades, os auditores caracterizaram a situação como trabalho em condições análogas à escravidão, conforme o Código Penal Brasileiro. Apesar das infrações, a empresa se disse disposta a firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para reparar danos e prevenir novas violações, comprometendo-se a custear o transporte e a alimentação para o retorno dos trabalhadores, além de indenizá-los em R$ 1.000,00 pelos bens perdidos.
Os auditores continuam no local acompanhando a situação, garantindo que os resgatados tenham acesso ao seguro-desemprego e pagamento integral das verbas rescisórias. Os trabalhadores contarão com o apoio do Projeto Ação Integrada (PAI), que oferece qualificação profissional e suporte para reinserção no mercado de trabalho.
Essa operação reflete a atuação contínua da Auditoria Fiscal do Trabalho na promoção de trabalho digno no Brasil, assegurando o cumprimento das leis trabalhistas e a proteção dos direitos humanos.
Denúncias de trabalho análogo à escravidão podem ser feitas de forma anônima pelo Sistema Ipê, disponível em https://ipe.sit.trabalho.gov.br. Também é possível realizar denúncias pelo Disque 100, que funciona 24 horas, garantindo acessibilidade a pessoas com deficiência auditiva.
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